Bodas de Prata de Olga Lenz Pedde e Leonhard Pedde

Bodas de Prata de Olga Lenz Pedde e Leonhard Pedde
Bodas de Prata de Olga Lenz Pedde e Leonhard Pedde - 31/07/1957

quarta-feira, 1 de maio de 2013

A Carta de Alfred Janke para Virginia Less


Prezada Sra. Less,
Faz algum tempo que tenho conhecimento de seu trabalho de pesquisa sobre os "Volhynians" através de Alexander Busenius.
A última notícia que recebi foi a história de Erica Neumann, que não conheço, mas cujo pai Adolf conhecia bem.
Olga Pedde conheço desde Volhynia – era uma família muito conhecida, o pai era mecânico e a mãe costureira. Até hoje tenho contato com ela.
Eu sou Alfred Janke, terceiro filho de Eduard e Ida Janke (Wuerch) e minha família é de Neumanofke, perto de Heimtal.
Heimtal tinha um pequeno centro de comércio e de 15 em 15 dias havia uma feira onde os agricultores vendiam e compravam produtos. A Igreja Luterana também ficava em Heimtal.
Em 1928 meus pais quiseram emigrar para o Canadá, mas não conseguiram o visto. Outros parentes já tinham ido para o Canadá (perto de Edmond e LÍDER) e também para a Argentina.
A razão de nossa saída era que o governo russo então comunista, determinou que cada agricultor entregasse um percentual de toda produção ao governo. O pior era que bandos a cavalo, que se diziam do governo, chegavam, levando animais, cavalos, bois, aves, etc... e não havia como protestar.
Um tio meu, August, foi preso, e deportado para a Sibéria por ter dado cobertura a um judeu (mascate). Nunca mais soubemos do meu tio.
Por tudo isso meu tio Karl Janke e Albert Bauer resolveram com meu pai de sair de Volhynia, já que meu pai tinha permissão para viajar pelo território russo porque tinha sido designado para alfabetizar os colonos adultos das aldeias russas, à noite.
Em julho de 1929 começou a aventura rumo à China. A razão de irmos para a China é que as demais fronteiras eram muito controladas e esperávamos que uma vez na China teríamos oportunidade de chegar ao Canadá ou Argentina, o que mais tarde não aconteceu.
Sabia-se que três famílias de Volhynia encontravam-se em Harbin: Ludwig Wuerch, Reinhard Golnik e Herbert Golnik. Para chegar lá, era preciso atravessar toda a Rússia; assim saímos de carroça até Pulin, depois de trem, mais carroça, com diversas baldeações, passando pelo Rio Amur, até chegar ao Rio Ussury onde encontramos refugiados alemães da Primeira Guerra, muito pobres, e que viviam praticamente de pesca.
Lá ficamos uns 15 dias, quando então atravessamos o Rio Ussuri de barco. Do outro lado duas carroças, já contratadas, nos esperavam; viajamos sempre à noite, para não sermos capturados pela guarda da fronteira. Levou 3 dias até chegarmos ao trem que nos levaria até Harbim. Foi uma viagem difícil por não entendermos o chinês e vice-versa.
Chegamos em Harbim em meados de agosto de 1929. Harbin tinha uma população de cerca 60.000 habitantes, sendo que 90% eram russos ortodoxos.
Em Harbim procuramos a família Golnik e alugamos então uma casa onde moramos por algum tempo. Não podendo mais pagar o aluguel procuramos os " mennonites " , que não nos receberam muito bem por sermos luteranos.
Com a chegada de mais refugiados, a comunidade luterana e o consulado alemão alugaram um alojamento onde nós também fomos morar. O alojamento ficava na rua " Madigo " e os zeladores eram Kronberg (pai e filho), e Stibner que, ao desentupir a fossa, morreram em conseqüência do gás. Neste alojamento tivemos como professor o Sr. Reinhart Holtz.
Com a chegada de mais refugiados de Ussuri foi alugado outro alojamento onde a professora era a Sra. Berta Neumann, mãe de Nicolai e Adelina. As vezes ensaiávamos todos juntos canções de Natal.
Em 1931 veio a guerra e a ocupação japonesa; foi quando morreu o Sr. Lange e outros ficaram feridos.
Em 2 de maio de 1932 partimos de Harbin de trem até Port Arthur. Em Port Arthur pegamos um navio cargueiro japonês, onde dormimos em esteiras. O navio jogava muito e todos enjoavam. Em Shangai embarcamos no navio cargueiro PORTOS (francês) adaptado para transportar soldados. O porão era todo instalado com beliches. Chegando em Saigon, paramos por 3 dias para abastecer com carvão e água. Para nós foi muito agradável, pois podíamos desembarcar e todos os dias íamos ao zoológico onde pela primeira vez vimos leões, elefantes, girafas e outros animais. Embarcaram marinheiros e soldados franceses, que retornavam da colônia e que foram muito gentis, pois brincavam e faziam ginástica conosco.
Seguimos viagem passando por Singapura, Djacarta. No Oceano Índico o navio enfrentou um temporal e tivemos que ficar durante um dia de colete salva-vidas e ninguém podia ir ao convés, pois as ondas passavam por cima do navio. Continuamos pelo Golfo Aden, Mar Vermelho, Canal Suez e Mediterrâneo. Passamos perto da Sicília, onde avistamos o vulcão Etna. Os adultos diziam que aquilo era a chaminé do inferno. A próxima parada foi Marselha, onde ficamos muito tristes, porque os nossos amigos marinheiros se despediram e desembarcaram, distribuindo balas para nós crianças.
Seguimos viagem de trem até Bordeaux. Em Bordeaux embarcamos no navio LIPARI. Três dias depois, em 21 de maio de 1932, nasceu meu irmão Woldemar. Paramos para abastecimento de água em Dakar. Seguimos então viagem para o Brasil, onde aportamos por 1 dia em Recife para abastecermos de água. Não era permitido desembarcar, mas esta parada ficou bem na nossa memória, pois foi ali que vimos pela primeira vez homens negros.
Continuamos até o Rio de janeiro, chegando no dia 28 de maio de 1932 – data oficial da nossa chegada ao Brasil. Ficamos 15 dias na Ilha das Flores para quarentena. No Rio de Janeiro embarcamos num pequeno navio misto, seguindo viagem para o sul.
Paramos por um dia em Florianópolis onde nos chamaram  atenção os bondes puxados por burros. Em Porto Alegra fomos recebidos pelo Dr. Lange (manager do Dr. Kullmann) que nos embarcou num trem à noite para Santa Bárbara. Viajamos ate às 15 horas do dia seguinte. Em Santa Bárbara fomos recebidos pelo Dr. Kullmann que nos explicou qual seria a ajuda e como seria a escolha da colônia. Explicou que os solteiros tinham que se juntar a uma família, possível, foram aconselhados pelo Dr. Lange que fossem para Ijuí, onde conseguiriam trabalho sem problemas com a língua portuguesa, porque nesta cidade quase todos eram alemães.
Seguiram então pra Ijuí: Erich Drude, Otto Eisner, Jakob Giese, Adolf Keller, Wilhelm Lange e outros. Eles se casaram por lá e certamente devem ter descendentes. Após 3 dias as outras famílias seguiram viagem em três caminhões (duas famílias em cada). A estrada era improvisada, os caminhões atolavam. Chegamos em Águas do Mel, hoje Irai, atravessamos o rio Uruguai de balsa, seguindo até Iracema, hoje Riqueza, onde ficamos em barracas improvisadas, tipo índios. Cada família escolhia então uma colônia, que deveria ser paga em três anos e foram distribuídas algumas ferramentas, como: 2 serras, uma grande para 2 pessoas operarem, e um menor, facão, enxada, foice e sementes de tabaco, milho, feijão, bata, etc...
A vaca e o cavalo prometidos nunca recebemos. Todos começaram a derrubar a mata e plantar. Alguns ficaram doentes como Adolf e Gerhard Bartz e Eduard Bitner que morreram de tifo. Meu pai também ficou doente, mas depois de um mês se recuperou. Minha mãe teve bolhas nas mãos que inflamaram e a deixaram sem movimento nenhum em dois dedos.
Assim que meu pai melhorou foi junto com Golnik para Ijuí, onde trabalharam na fabricação de móveis, instrumentos musicais, como violinos, violões, etc... Mais tarde minha mãe e nós, filhos, também fomos para Ijuí.
Outros colonos também saíram de Riqueza por não se adaptarem.O terreno era muito montanhoso e rochoso, não havendo possibilidade de usar máquinas, a agricultura só podendo ser praticada manualmente.
Em 1942 resolvi ir para Porto Alegre onde trabalhei e estudei em uma escola técnica de profissões. Em 1947 fiz concurso para técnico IBM no Rio de Janeiro, onde trabalhei durante 34 anos.
Nos anos 1950-1951 Alexander e eu tentamos emigrar para o Canadá, mas não conseguimos porque em nossos documentos constava apátrida ( " heimatlos " ). Em julho de 1953 casei-me com Margarida Busch. Novembro de 1959 nasceu nossa filha Mônica e em setembro de 1961 nasceu Ilka, da qual tenho duas netas: Juliana e Tatiana.
Em 1983 visitei meus parentes (Wuerch) no Canadá, que vivem na província de Alberta e Vancouver, B.C. e visitei também as principais cidades deste país maravilhoso.
Conheço alguns países sul-americanos e europeus. Agora aos 77 anos tentei apresentar a minha história de vida. A minha família: Pai – Eduard Janke * Mãe – Ida Janke * Filhos – Edgar Janke Helmuth Janke * * = falecidos Alfred Janke Gerhard Janke Elmar Janke * Wiligard Janke * Woldemar Janke.
Completou Ilka por ocasião do envio da cópia em dezembro de 2007:
"Isso foi narrado quando meu pai tinha 77 anos, hoje ele tem 82 anos, fazendo 83 anos no dia 10 de julho."

A carta é publicada na íntegra a pedido da leitora
Juliana. Todos os direitos estão reservados a família de Alfred Janke.


A Imagem - retrata Alfred Janke e Olga Lenz Pedde - 02 nov 2000. Fotógrafa Romi Monica Pedde Muss.